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De Documentação

METODOLOGIA PARA A CONSTRUÇÃO DO GEOCÓDIGO NACIONAL EM SISTEMA DE GRADE REGULAR DISCRETA

PETER KRAUSS, LUIS FELIPE, CLAITON NEISSE, THIERRY JEAN

Instituto de Tecnologias Geo-Sociais Addressforall

Um geocódigo é um identificador único de um objeto ou localização geográfica, que o distingue de outras em um conjunto finito de entidades geográficas. Ele pode compreender uma multiplicidade de aplicações, tais como: rotulagem e integridade de dados, indexação espacial, subsídio a sistemas de geocodificação e navegação, dentre outros. Um exemplo típico de sistema de geocódigo são as abreviações de duas letras padronizadas pela ISO 3166, onde cada abreviação se torna um geocódigo ao ser associada ao respectivo mapa do país, ou seja, a entidade representada pelos limites geográficos da jurisdição. O conjunto de todos os países forma um mosaico que cobre toda a superfície terrestre do globo. Em seguida, para o caso do Brasil, a norma ISO 3166-2:BR estabelece as jurisdições locais de primeiro nível,  que são as siglas hierárquicas associadas a cada estado, tais como “BR-MG” para Minas Gerais.

O Código de Endereçamento Postal (CEP) do Brasil vigente nos anos 1970 e 80 era também um sistema de geocódigo hierárquico vinculado a um mosaico de jursdições, pois permitia associar por exemplo o município de Macapá ao CEP 68900, e seus distritos com o CEP “689xx”. O CEP de 8 dígitos da década de 1990 em diante, perdeu o seu mosaico mas ainda permite associação com entidades geográficas, que são os logradouros. Todavia para que se atualize com as tecnologias dos anos 2020 de maneira mais ampla, apoiando outras aplicações, o CEP precisa se renovar integralmente, perdendo a compatibilidade com o original. Existem diversas alternativas de geocódigos curtos que permitem “chegar na porta de casa”, tais como Geohash, Mapcode, PlusCodes ou OSMcodes [4].

Todas essas alternativas possuem em comum o uso de uma grade regular discreta que torna mais compacta a representação de um ponto geográfico, dentro da precisão de ~5 metros nos espaços urbanos e ~20 metros no meio rural. A proposta metodológica OSMcodes adere à extensão do padrão GeoURI [5], permitindo que cada país escolha a sua grade, para atender às finalides de julgar prioritárias. É pressuposta uma grade oficial multifinalitária.

Dentre as diversas aplicações a serem harmonizadas com um código postal, se destacam as aplicações estatísticas, em particular o Censo populacional do país. Por exemplo o IBGE no Brasil padronizou em 2016 a projeção Albers de igual-área; a Colômbia adota o seu “Sistema de Proyección Único” desde a promulgação da Resolução IGAC 471 de 2020. São decisões soberanas, de cada país, que garantem a interoperabilidade dos dados na sua INDE.

Três diretivas devem nortear o desenvolvimento de um  geocódigo nacional:

  1. racionalidade – as decisões técnicas devem ser tomadas utilizando justificativas cientificas, com evidências reprodutiveis e comprovação amplamente aceita;
  1. abertura e descentralização – todos os métodos, algoritmos, datasets e nomenclaturas devem ser construídos e publicados com licenças abertas, seguindo os princípios da Ciência Aberta, possibilitando a participação ampla durante o desenvolvimento, e, uma vez implementado o sistema de geocódigos, a sua operação deve ser independete de autoridades centrais (munido apenas do algoritmo o morador descobre o geocódigo da sua casa);
  1. multifinalidade – ele deve contemplar um conjunto amplo de aplicações e sua interoperabilidade, incluindo aplicações postais, imobiliárias, estatísticas e computacionais.

O passo-a-passo do desenvolvimento do geocódigo nacional, dentro da metodologia OSMcodes, foi ilustrado pela Figura 1. As justificativas para cada uma das decisões podem ser resumidas da seguinte forma:

D1 - Geocódigo multifinalitário e hierárquico: para além da finalidade básica do geocódigo como código postal, todas as demais exigem mais opções de escala (mais grades) e comportamento hierárquico,[18] ou seja, garantia de que dois geocódigos com mesmo prefixo estejam ocupando mesma região. A multifinalidade é justificada pelo benefício ao cidadão, pela redução de custos em comunicação formal e informal no país, e pelo investimento em tecnologias não-estanques, interoperáveis. Se milhões de cidadãos vão decorar o geocódigo de sua casa, que seja útil para mais de uma finalidade.

D2 - Projeção de igual-área: grandezas termodinâmicas intensivas (ex. temperatura ou densidade populacional) e extensivas (ex. focos de incêndio ou populaçao local) precisam ser intercambiáveis, mas quando representadas em mapas, esta operação só se torna natural se a representação das grandezas for realizada em grade regular de igual-área. Similarmente geo-campos e geo-objetos na conceituação de [9] e [10], e a agregação-desagregação do Censo [13].  Grades hierárquicas do tipo DGGS, padronizadas pelo OGC em 2017 [11] e pela ISO  em 2021 [12] também requerem projeções de igual-area.

D3 - Área territorial pequena: países maiores, como Brasil e Colômbia requerem o máximo de compactação no geocódigo postal (versão curta) para que seus usuários consigam memorizar. Países tais como o Uruguai ou menores, não se beneficiam tanto de compactação da base32, conseguindo resultados similares com a base16 (hexadecimal), podendo portanto usar o mesmo geocódigo nas aplicações postais e científicas.

D4 - Compromisso com grades legadas: tipicamente as grades com quadrados de 1 km de lado são solicitadas como padrão para o intercâmbio e comparação internacionais. O uso da grade de 1024 metros todavia costuma ser aceito para esse tipo de demanda.

D5 - Compromisso com cobertura legada: no caso do Brasil já existia uma articulação de quadrantes passível de adaptação, no caso da Colômbia nenhuma sugestão oficial. A decisão pode impactar no acréscimo de mais um dígito ao geocódigo absoluto, mas não no curto.

D6 - Intervalos de geocódigos: em computação o balanceamento de cargas entre partições de disco requer a escolha de geocódigos de diferentes grades da hierarquia [14], mas uma segunda estratégia é a escolha de intervalos de geocódigos de uma mesma grade. Outras aplicações, tais como definição de setores territoriais na gestão pública, podem também fazer uso de intervalos. O demanda ou não por intervalos contínuos determina qual indexação utilizar, tipicamente a escolha entre “Curva Z” de Morton e “Curva U” de Hilbert [15].

Essa proposta metodológica já está sendo aplicada na construção de um geocódigo nacional da Colômbia, em parceria com o Departamento Administrativo Nacional de Estadística (DANE); e no Brasil, como iniciativa do Instituto AddressForAll e comunidade OSM-BR, fazendo uso da Grade Estatística do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) [6, 7, 8]. Em ambos os casos são ofertados dois sistemas hierárquicos de grades interoperáveis:

  • sistema de grades do geocódigo postal, base32 com 8 níveis (até escala de 1 m);
  • sistema de grades do geocódigo científico, base16h [16] com 36 níveis.

Figuras

Osmc-method-3sbide grade.png

Figura 1. Árvore de decisão sugerida pela Metodologia OSMcodes, que adota o Generalized-Geohash. A decisão D8 não se relaciona com a grade.


Osmc-CO-cover-L0.png.png

Figura 2. Resultado da decisão D5 na Colômbia, pela cobertura de células do nível zero e seu ajuste nas extremidades. Percebe-se também as decisões D3, por um código postal base32, e D7, pela adoção do alfabeto NVU, consumido por 29 células territoriais, uma célula insular (com projeção diferenciada em D2) e mantendo 2 células como “reserva de segurança”.

REFERÊNCIAS

[1] ISO 3166-1 ALFA-3. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2021. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=ISO_3166-1_alfa-3&oldid=61524396>. Acesso em: 2 jul. 2021.

[2] ISO 3166-2:BR. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2020. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=ISO_3166-2:BR&oldid=58421165>. Acesso em: 3 jun. 2020.

[3] Tudo sobre CEP. In: Correios. 2022. Disponível em: <https://www.correios.com.br/enviar/precisa-de-ajuda/tudo-sobre-cep>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[4] Organização OSM.Codes. In: GitHub. 2022. Disponível em: <https://github.com/osm-codes>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[5] KRAUSS, Peter; JEAN, Thierry; BORTOLINI, Everton. Proposta do Brasil para o mundo: expansão do protocolo GeoURI (RFC 5870 da internet) visando a interoperabilidade de geocódigos nacionais soberanos. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFRAESTRUTURA DE DADOS ESPACIAIS, II, 2020, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos [...]. Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: <https://inde.gov.br/images/inde/ANAIS_2SBIDE.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[6] IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Grade Estatística. Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: <http://geoftp.ibge.gov.br/recortes_para_fins_estatisticos/grade_estatistica/censo_2010/grade_estatistica.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[7] KRAUSS, Peter & ALMEIDA, Rubens de. Grade Estatística do Brasil: uma proposta de melhora orientada a geocódigos hierárquicos e multifinalitários. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFRAESTRUTURA DE DADOS ESPACIAIS, II, 2020, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos [...]. Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: <https://inde.gov.br/images/inde/ANAIS_2SBIDE.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[8] KRAUSS, Peter; CUNHA, Luis; JEAN, Thierry. IBGE Statistical Grid in Compact Representation. In: GEOINFO, XXII, 2021, São José dos Campos. Anais eletrônicos [...]. São José dos Campos, 2021. Disponível em: <http://mtc-m16c.sid.inpe.br/ibi/8JMKD3MGPDW34P/45U7J5H>. Acesso em: 13 jul. 2022.

[9] M. F. Goodchild, M. Yuan & T. J. Cova (2006), “Towards a general theory of geographic representation in GIS”, urn:doi:10.1080/13658810600965271

[10] J. P. Cordeiro, C. C. F. Barbosa e G. Câmara (2007) “Álgebra de Campos e Objetos”, cap 8 do livro “Introdução à Geoinformática”, http://www.dpi.inpe.br/gilberto/livro/introd/cap8-algebra.pdf

[11] OGC 2017. “Topic 21: Discrete Global Grid Systems Abstract Specification”, http://docs.opengeospatial.org/as/15-104r5/15-104r5.html

[12] ISO 2021. “ISO 19170-1:2021.  Geographic information — Discrete Global Grid Systems Specifications — Part 1: Core Reference System and Operations, and Equal Area Earth Reference System”, https://www.iso.org/standard/32588.html

[13] IBGE 2016. “”, https://geoftp.ibge.gov.br/recortes_para_fins_estatisticos/grade_estatistica/censo_2010/grade_estatistica.pdf

[14] OSMcodes. Balanço de carga nas partições hcode https://git.osm.codes/WS/blob/main/docs/hcode-partitionBalance.md

[15] Peter Krauss 2019. “Sfc4q classes”,  https://ppkrauss.github.io/Sfc4q

[16] Krauss et al. Natural Codes. http://osm.codes/_foundations/art1.pdf

[17] Burt, James E.; Barber, Gerald M. (2009). Elementary statistics for geographers (3rd ed.). Guilford Press. ISBN 978-1572304840

[18] - EDUARDO DE REZENDE FRANCISCO, HE NEM KIM SEO, JOSÉ AUGUSTO SAPIENZA RAMOS, LUIZ UGEDA, PETER KRAUSS, RUBENS DE ALMEIDA, “POR UMA INDE COM ‘OPÇÕES DE CARDÁPIO LIGHT’, PARA MELHOR ADESÃO DO PODER PÚBLICO LOCAL – TECNOLOGIA X GOVERNANÇA X MATURIDADE”. https://inde.gov.br/images/inde/sessao4/POR_UMA_INDE_COM_%20OPCOES_DE_CARDAPIO_%20LIGHT.pdf